Envio obedece entendimento do STF sobre foro especial para crimes do exercício de mandato

O Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba (TRE-PB) determinou o envio da principal ação penal da Operação Calvário ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo a informação divulgada na quarta-feira (23/07), a decisão segue entendimento recente do Supremo Tribunal Federal (STF), que garante foro especial mesmo após o término do mandato, desde que os delitos tenham ocorrido durante o exercício da função pública.

A ação envolve uma suposta organização criminosa acusada de firmar contratos fraudulentos com organizações sociais durante os governos de Ricardo Coutinho, ex-governador da Paraíba, entre 2011 e 2018.

Réus citados na Operação Calvário e suas respectivas situações conhecidas atualmente, cargos anteriores e situações legais que já os alcançaram:

NomeOcupação atualCargos anterioresObservações legais
Ricardo CoutinhoAtuação política no PT; sem cargo eletivo oficialGovernador da Paraíba; prefeito de João PessoaRéu em múltiplas ações penais no STJ; já foi preso preventivamente em 2019
Cida RamosDeputada estadual (PT-PB); presidente estadual do PTSecretária de Desenvolvimento Humano da PB; vereadora de João PessoaRé em ação penal no STJ; mantém foro privilegiado como parlamentar
Estelizabel BezerraSecretária Nacional no Ministério das MulheresDeputada estadual; secretária de Comunicação Institucional da PBRé em ação penal no STJ; nomeada por portaria oficial do governo federal
Ney SuassunaSem função pública conhecidaSenador da República; ministro interino da Integração NacionalRé em ação penal no STJ; citado em contratos suspeitos com organizações sociais
Márcia LucenaCoordenadora no Ministério dos Direitos Humanos; diretora no IPHANPrefeita de Conde; secretária de Educação da PBRé em ação penal no STJ; nega envolvimento e alega perseguição judicial
Livânia FariasSem ocupação públicaSecretária de Administração da PB; diretora da PBGÁSRé e colaboradora premiada; delações foram base para investigações iniciais
Cláudia VerasSem ocupação pública conhecidaSecretária de Saúde da PBRé em ação penal no STJ; envolvida em contratos com organizações sociais
Waldson de SouzaSem ocupação pública conhecidaSecretário de Saúde e Planejamento da PBRé em ação penal no STJ; citado em desvios na área da saúde
Gilberto CarneiroSem ocupação pública conhecidaProcurador-Geral do Estado; secretário de Administração de João PessoaRé em ação penal no STJ; acusado de participação ativa na estrutura jurídica do esquema

Fontes: Decisões judiciais do STJ, portarias do Diário Oficial da União e reportagens recentes.

A decisão de remeter o caso ao STJ baseia-se na ausência de competência originária do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para julgar crimes comuns, mesmo quando houver conexão com a esfera eleitoral.

A movimentação reforça os desdobramentos da Calvário, uma das operações mais marcantes da história da Justiça paraibana no combate à corrupção em setores como saúde e educação.

Possibilidade de prescrição

Para tentar evitar a possiblidade de prescrição dos processos, o Pleno do TRE-PB aprovou ainda no início do mês de maio de 2025, mudanças na estrutura organizacional. O novo organograma visa priorizar o processamento e julgamento de Processos Criminais Complexos e das Prestações de Contas Eleitorais e Partidárias.

Leia também: TRE-PB reforma estrutura para força-tarefa e conclusão das operações ‘Calvário’ e ‘Território Livre

Para o presidente do TRE-PB, Oswaldo Trigueiro do Valle Filho, “isso traz o reforço nas estruturas de apoio à análise dos crimes complexos conexos a crimes eleitorais e também das Prestações de Contas Partidárias e Eleitorais”.

Vale a pena lembrar que diversos magistrados e magistradas já se declaram suspeitos ou impedidos de julgarem ações que tem como réu o ex-governador Ricardo Coutinho, tanto na esfera criminal como também na cível.

O número de suspeições no caso da Calvário chama atenção, caso nunca antes visto na esfera judicial paraibana.

Até julho de 2025, nove magistrados já se declararam suspeitos para julgar ações penais envolvendo o ex-governador Ricardo Coutinho, no âmbito da Operação Calvário e, pelo menos, um juiz devolveu a ação para a Vara Criminal de onde tinha recebido. A maioria alegou foro íntimo, conforme previsto no Código de Processo Penal e na Resolução nº 250 do CNJ.

Somente na ação movida por falsidade ideológica, foram seis os juízes que se consideraram suspeitos para prosseguir com o julgamento: Shirley Abrantes Moreira Régis (em 2/9/21); Antônio Maroja Limeira Filho (em 13/9/21); Ana Carolina Tavares Cantalice (em 20/9/21); Isa Monia Vanessa de Freitas Paiva (em 5/9/21); José Márcio Rocha Galdino (em 8/4/22); e Marcos William de Oliveira (em 11/4/22). Um sétimo, Marcial Henrique Ferraz da Cruz, mandou o processo retornar à 6ª Vara Criminal de João Pessoa em 14/3/22. Já o processo que foi remetido para a Justiça Eleitoral por determinação de Gilmar Mendes soma outras três desistências pelo mesmo motivo alegado pelos magistrados da área criminal: “foro íntimo”. Magnogledes Ribeiro Cardoso (em 7/3/22), Onaldo Rocha de Queiroga (em 30/3/22) e Hermance G. Pereira (em 11/4/22), num período de 34 dias, também desistiram de julgar as acusações feitas pelo Gaeco“, lembra matéria publicada pelo Conjur.

Essa série de suspeições tem gerado atrasos significativos nos processos, contribuindo para o risco de prescrição penal

O TRE-PB, inclusive, está reestruturando sua estrutura interna para acelerar os julgamentos e evitar que os crimes fiquem impunes.

Operação Calvário

A Operação Calvário foi deflagrada em dezembro de 2018 pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB), em parceria com o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), com o objetivo de desarticular uma organização criminosa que atuava na gestão de recursos públicos por meio de contratos com organizações sociais, especialmente na área da saúde e educação.

O esquema envolvia a Cruz Vermelha Brasileira (filial RS) e o IPCEP, que gerenciavam hospitais públicos na Paraíba. As investigações apontaram que, entre 2011 e 2018, o grupo teve acesso a mais de R$ 1,1 bilhão em recursos públicos, com suspeitas de fraudes em licitações, desvio de verbas e pagamento de propinas.

Entre os principais alvos estão ex-gestores do governo Ricardo Coutinho, incluindo secretários, prefeitos, deputados e empresários. A operação teve várias fases, sendo a mais emblemática a chamada “Juízo Final”, que resultou na prisão de Coutinho e outros aliados em dezembro de 2019.

O ex-governador é apontado como líder do núcleo político da organização, responsável por decisões estratégicas e pela distribuição de propinas. As denúncias envolvem também financiamento ilegal de campanhas eleitorais, uso de dinheiro em espécie e ocultação de patrimônio.

Até hoje, o caso segue em tramitação no Superior Tribunal de Justiça (STJ), com dezenas de réus e desdobramentos judiciais em curso. A operação é considerada uma das maiores investigações de corrupção da história da Paraíba.

(Fonte: Redação Click100 com blog do Wallison Bezerra, MPPB, STJ, DOU, TRE-PB, Conjur / Foto: Ascom STJ)

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