O Senado aprovou nesta quarta-feira (21), por 54 votos a 13, o projeto que cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA). O PL 2.159/2021, que está sendo discutido no Congresso desde 2004, traz normas gerais e diretrizes sobre o licenciamento. A intenção é uniformizar os procedimentos para emissão de licença ambiental em todo o país e simplificar a concessão de licenças para os empreendimentos de menor impacto. Aprovado com mudanças, o texto voltará para a Câmara dos Deputados. Segundo a relatora de Plenário, senadora Tereza Cristina (PP-MS), a legislação atual configura um verdadeiro cipoal com cerca de 27 mil normativos.

Uma das alterações feitas pelo Senado é a criação de um novo tipo de licença, com rito simplificado, para projetos considerados prioritários pelo governo. A expectativa de alguns senadores é de que essa licença, com rito simplificado e dispensa de etapas, possibilite a exploração de petróleo na Amazônia.

O projeto, do ex-deputado Luciano Zica (PT-SP), tramitou por 17 anos na Câmara dos Deputados e foi aprovado em 2021. No Senado, chegou há quatro anos e foi fruto de diversas negociações. A votação nas comissões de Meio Ambiente (CMA) e de Agricultura (CRA) teve relatório unificado dos senadores Confúcio Moura (MDB-RO) e Tereza Cristina. O projeto foi aprovado nas duas comissões na terça-feira (20) e seguiu para o Plenário com pedido de urgência.

É pelo licenciamento ambiental que o poder público autoriza a instalação, a ampliação e a operação de empreendimentos que utilizam recursos naturais ou podem causar impacto ao meio ambiente. Alguns exemplos incluem a construção e ampliação de rodovias, aeroportos, indústrias têxteis, metalúrgicas, e de papel e celulose, além de postos de gasolina, hidrelétricas e empreendimentos turísticos e urbanísticos, como hotéis e loteamentos, entre outros.

O projeto trata do licenciamento realizado nos órgãos e entidades dos entes federados integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama). Um dos objetivos é garantir a segurança jurídica criada pela Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA).

Nova licença

Uma das principais mudanças no texto foi feita nesta quarta-feira (21) em Plenário. Proposta pelo senador Davi Alcolumbre (União-AP), presidente do Senado, a emenda cria a Licença Ambiental Especial (LAE). O procedimento, baseado em uma única licença, terá rito especial, com dispensa de etapas e prioridade na análise. Esse tipo de licença será aplicado a projetos previamente listados como prioritários pelo Poder Executivo, com base em manifestação do Conselho de Governo. O prazo máximo de análise para a emissão da licença será de um ano.

O Conselho, já previsto na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, tem a função de assessorar o Presidente da República na formulação da política nacional e nas diretrizes governamentais para o meio ambiente e os recursos ambientais. Com a nova redação dada pela emenda, ganha a atribuição de propor obras, serviços, projetos ou atividades para a lista de empreendimentos estratégicos, para fins de licenciamento ambiental.

A criação dessa licença especial pode possibilitar o avanço da autorização para a exploração de petróleo na Amazônia, como no caso do pedido feito pela Petrobras para explorar petróleo na Margem Equatorial do Rio Amazonas.

Mineração

Outra mudança feita no Senado em um ponto polêmico do projeto foi a inclusão na LGLA das atividades de mineração de grande porte ou de alto risco. O texto aprovado na Câmara dos Deputados havia retirado essas atividades do âmbito de aplicação da lei, remetendo o licenciamento da grande mineração às disposições do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) até que fosse promulgada lei específica.

Com relação à licença para atividades de agropecuária, os senadores mantiveram o texto da Câmara. O projeto aprovado diz que essas atividades não são sujeitas a licenciamento ambiental, mas impõe condições para isso, como a regularidade ou o processo de regularização da propriedade ou da posse da terra e a obtenção de autorização para a supressão de vegetação nativa, por exemplo.

Outra mudança com relação ao texto da Câmara foi na lista de atividades que não são sujeitas a licenciamento ambiental. O Senado manteve a dispensa de licenciamento somente para atividades que não oferecem risco ambiental ou para atividades que precisam ser executadas por questão de soberania nacional ou de calamidade pública (veja na tabela). Em Plenário, foram incluídas na dispensa de licença as obras de manutenção e melhoramento de infraestrutura em rodovias anteriormente pavimentadas. 

Várias atividades que eram dispensadas de licença pelo texto da Câmara foram retiradas da lista pelo Senado, como sistemas e estações de tratamento de água e de esgoto sanitário; além de locais referentes a depósito e reciclagem de resíduos sólidos.

Adesão e Compromisso 

O projeto aprovado no Senado prevê que a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC) será simplificada e expedida mediante uma espécie de autodeclaração de adesão e compromisso do empreendedor, com os requisitos preestabelecidos pela autoridade licenciadora.

O projeto libera a LAC para a maior parte dos empreendimentos no Brasil, já que será válida, aos licenciamentos em geral, com exceção apenas daqueles de alto impacto no meio ambiente.

Pelo texto da Câmara, a única condição para a LAC seria que a atividade ou o empreendimento não fosse potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente.

No Senado, foram acatadas parcialmente emendas dos senadores Jaques Wagner (PT-BA), Randolfe Rodrigues (PT-AP) e Eliziane Gama (PSD-MA) para prever que a LAC só será permitida para empreendimentos considerados de pequeno ou médio porte e baixo ou médio potencial poluidor, em que a entidade licenciadora não tiver identificado relevância ou fragilidade ambiental.

Entre as demais exigências para a LAC está o prévio conhecimento das características gerais da região da implantação; das condições de instalação e de operação da atividade; e dos impactos ambientais.

A licença não será autorizada se houver desmatamento de vegetação nativa, já que nesse caso há necessidade de autorização específica. Além disso, será necessário juntar o Relatório de Caracterização do Empreendimento (RCE). Foi acrescida emenda de relator definindo o prazo mínimo de cinco anos e máximo de dez anos para a LAC, consideradas as informações prestadas no RCE.

Renovação automática de licenças

O texto da Câmara permitia a renovação automática das licenças ambientais. Essa regra valeria a qualquer tipo de licença ou de empreendimento, independentemente de análise por parte da entidade licenciadora, apenas com uma espécie de autodeclaração do empreendedor.

Os relatores no Senado acataram parcialmente emenda do ex-senador Jean-Paul Prates (RN) e restringiram essa renovação automática apenas para atividade considerada pelo ente federativo como de baixo ou médio potencial poluidor e pequeno ou médio porte que apresente relatório de cumprimento das condicionantes do contrato.

Mesmo assim, a renovação automática só será feita se não houver alteração nas características e no porte do empreendimento, se não tiver ocorrido alteração na legislação ambiental aplicável e se forem cumpridas as condicionantes da licença, mediante apresentação de relatório assinado por profissional da área.

Os relatores também acolheram parcialmente emenda do senador Paulo Paim (PT-RS) para prever que alterações na operação da atividade, que não tenham impacto ambiental negativo avaliado nas etapas anteriores do licenciamento, sejam comunicadas com antecedência mínima de 30 dias à autoridade licenciadora. Depois desse prazo, se não houver manifestação do órgão público, será considerado que a autorização foi concedida.

Penas por obra sem licença

O Senado também aumentou a pena para o crime de construir ou reformar obras ou serviços poluidores sem licença ambiental. Atualmente, a pena prevista na Lei 9,605, de 1998, que traz as sanções por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, vai de um a seis meses de prisão. Na Câmara, a pena foi aumentada para dois meses a um ano. No Senado, a pena mudou para seis meses a dois anos.

A pena ainda pode ser aumentada até o dobro se o licenciamento da atividade ou do empreendimento for sujeito ao Estudo Prévio de Impacto Ambiental.

Titularidade

Em Plenário, além da emenda que criou a LAE, a relatora aceitou outras mudanças das 56 sugeridas pelos senadores. Emenda do senador Jaime Bagattoli (PL-RO) fixa o prazo de até 30 dias para pedidos de alteração de titularidade de empreendimentos ou atividades já licenciadas. Atualmente, de acordo com o senador, não há um prazo definido para esses processos.

Outra emenda acatada, do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), busca oferecer segurança jurídica ao servidor público. O texto estabelece que a responsabilidade criminal e administrativa na concessão de licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais se dará apenas se houver dolo (intenção). A emenda exclui a forma culposa da conduta, que atualmente é punida com três meses a um ano de detenção, além de multa.

Também foram acatadas nas comissões emendas do senador Jayme Campos para alterar a Lei da Mata Atlântica e a Lei Complementar 140, de 2011 e assim evitar conflito sobre qual ente federativo deverá ser o responsável pelo licenciamento ou pela autorização de desmatamento de terras em divisas entre estados e municípios.

Outras emendas acolhidas, dos senadores Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Mecias de Jesus (Republicanos-RR) simplificam o licenciamento relativo a projetos relacionados à segurança energética nacional.

Atividades dispensadas
de licenciamento ambiental

Agropecuária

Cultivo agrícola e pecuária extensiva, semi-intensiva e intensiva de pequeno porte, já reguladas pelo Código Florestal.

Atividade Militar

Atividades militares de preparo e emprego das Forças Armadas que não causem impacto ambiental.

Atividades Não Listadas

Atividades que não estejam listadas como sujeitas a licenciamento ambiental.

Emergência

Obras e intervenções emergenciais em situações de calamidade pública decretadas.

Infraestrutura

Serviços e obras para manutenção e melhoria de infraestrutura em instalações ou faixas de domínio, inclusive rodovias já pavimentadas. Obras de distribuição de energia elétrica até 138Kv.

Reação do Ministério do Meio Ambiente

O Ministério do Meio Ambiente, comandado por Marina Silva, divulgou nota na quarta-feira (21/05) se manifestando contra o projeto. Confira.

Projeto de Lei do Licenciamento Ambiental desestrutura regramento e viola Constituição Federal

m trâmite no Congresso Nacional, o Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que dispõe sobre o licenciamento ambiental, representa desestruturação significativa do regramento existente sobre o tema e representa risco à segurança ambiental e social no país. Além disso, afronta diretamente a Constituição Federal, que no artigo 225 garante aos cidadãos brasileiros o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com exigência de estudo prévio de impacto ambiental para instalação de qualquer obra ou atividade que possa causar prejuízos ambientais.

O texto também viola o princípio da proibição do retrocesso ambiental, que vem sendo consolidado na jurisprudência brasileira, segundo o qual o Estado não pode adotar medidas que enfraqueçam direitos. Contraria, ainda, decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceram a inconstitucionalidade da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para atividades de médio impacto ambiental.

Ao permitir que a definição de atividades sujeitas ao licenciamento ambiental ocorra sem coordenação nacional e fora do âmbito de órgãos colegiados, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e os Conselhos Estaduais e Municipais, o projeto pode promover a ação descoordenada entre União, Estados e Municípios no processo de licenciamento ambiental e desarticular os mecanismos de participação social. O PL é, por fim, omisso em relação à crise climática, sem sequer mencionar a questão em seu conteúdo, fazendo com que o processo de licenciamento desconsidere esse tema crucial. 

Portanto, a proposta terá impacto negativo para a gestão socioambiental, além de provocar, possivelmente, altos índices de judicialização, o que tornará o processo de licenciamento ambiental mais moroso e oneroso para a sociedade e para o Estado brasileiro.

É fundamental que o Poder Legislativo assegure o equilíbrio entre a celeridade desejada pelos setores produtivos e a necessidade de preservar os instrumentos essenciais à proteção ambiental. Um marco legal eficaz deve promover o desenvolvimento sustentável com base em critérios técnicos, transparência e responsabilidade institucional, em consonância com os princípios constitucionais que regem a tutela do meio ambiente. 

A seguir, os principais retrocessos trazidos pelo PL 2.159/2021:

Licença por Adesão e Compromisso (LAC)  

Um dos pontos mais críticos do PL é a aplicação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), modalidade simplificada de licenciamento baseada na autodeclaração do empreendedor. A proposta permite que empreendimentos de médio porte e potencial poluidor utilizem esse mecanismo sem a exigência de estudos prévios de impacto e sem a definição de condicionantes ambientais específicas. 

Na prática, o texto permitiria o uso da LAC para um percentual expressivo de empreendimentos que atualmente são licenciados. Além disso, esses empreendimentos seriam monitorados por amostragem, dispensando a necessidade de fiscalização, pelo órgão ambiental, de todos os empreendimentos licenciados por essa modalidade.

A proposta também prevê a aplicação da LAC a projetos como duplicação de rodovias e dragagens, inclusive em regiões sensíveis e habitadas por comunidades vulneráveis, que podem ser autorizados sem qualquer análise técnica prévia, aumentando o risco de danos ambientais e sociais. 

Outra questão alarmante é a utilização da LAC como instrumento de regularização de empreendimentos em operação sem qualquer licença ambiental. Para o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), a LAC deveria ser adotada somente para projetos de pequeno porte, baixo impacto e que não envolvam áreas sensíveis, sempre com verificação do Relatório de Caracterização do Empreendimento (RCE) por parte do órgão licenciador.

Fragilização do SISNAMA e do papel do ICMBio 

O PL retira atribuições técnicas e normativas dos órgãos colegiados do Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e os Conselhos Estaduais. Ao transferir competências decisórias para entes federativos de forma descoordenada, pode estimular uma “concorrência antiambiental” entre estados e municípios, que, no intento de atrair mais investimentos, poderão oferecer flexibilizações e padrões menos rigorosos que os municípios ou estados vizinhos, comprometendo a uniformidade dos critérios e a efetividade da fiscalização.

Além disso, o texto enfraquece o papel do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ao permitir que empreendimentos em unidades de conservação sejam licenciados sem a manifestação obrigatória prévia do órgão gestor da área. Segundo o MMA, tal alteração representa o enfraquecimento do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e abre margem para que empreendimentos impactem diretamente áreas protegidas, como Parques Nacionais e Estações Ecológicas Federais, sem o devido controle.

De modo similar, a proposta determina que a manifestação dos órgãos competentes pela proteção de Terras Indígenas ocorreria somente em relação a áreas homologadas e territórios quilombolas já titulados. A não conclusão do processo de reconhecimento formal dos territórios indígenas ou quilombolas pelo Estado não significa que neles não existam comunidades que devem ser ouvidas, conforme determina a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. O descumprimento desse direito pode gerar questionamentos judiciais que provocarão atrasos e conflitos para o processo de licenciamento. 

Omissão ante impactos indiretos e sinérgicos

Outro ponto apontado como retrocesso é a exclusão, pelo PL, das áreas de influência indireta (AII) nos estudos de impacto ambiental. A medida compromete a análise de impactos cumulativos, como desmatamento, pressão sobre comunidades indígenas, contaminação de corpos d’água e grilagem de terras — frequentemente decorrentes de grandes empreendimentos como hidrelétricas, estradas e portos. 

Para o MMA, a impossibilidade de prever e mitigar esses impactos prejudica a capacidade do Estado de garantir o equilíbrio ecológico e a justiça socioambiental, ampliando o risco de judicialização e atrasos nos projetos.

Questionamento de condicionantes e dispensa para atividades agropecuárias   

Além disso, a proposta admite que os empreendedores questionem o estabelecimento de condicionantes ambientais de impactos indiretos com base na ausência de “nexo causal comprovado” ou por não terem “poder de polícia” sobre as ações de terceiros. 

A comprovação do nexo causal direto pode dificultar ou inviabilizar a imposição de medidas preventivas e compensatórias, tendo como exemplo o caso da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em que a dificuldade em atribuir responsabilidade por impactos indiretos comprometeu a reparação de danos às comunidades afetadas e ao meio ambiente. 

A possibilidade de que o empreendedor questione condicionantes sob o argumento de não ter ingerência sobre terceiros ou poder de polícia traz uma ampla gama de possibilidades de questionamentos com o potencial de gerar dúvidas, resultando em insegurança jurídica e maiores prazos para o processo. 

O PL prevê ainda que atividades como agricultura e pecuária sejam dispensadas de licenciamento ambiental caso estejam inscritas no Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou aderidas ao Programa de Regularização Ambiental (PRA). O MMA alerta que esses instrumentos não avaliam impactos como uso excessivo de água, poluição do solo e pressão sobre áreas de preservação, podendo legitimar danos significativos sem análise técnica.

(Fonte: Agência Senado com Secom PR / Imagem: reprodução Agência Senado | Jonas Pereira)

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